terça-feira, 12 de julho de 2016

Recordações



Têm certas coisas que ficam guardadas eternamente dentro de nós, tornam-se marcas, cicatrizes ou lembranças que enfraquecem, mas não somem do nosso interior. O cheiro, as cores, um objeto, a música, um verso, o frio e tantas outras coisas eu transformei em amor escrito. Fiz da dor, poema; dos sonhos e das vivências, contos; do medo, uma imaginação fértil para criar estratégias de superação.
Penso que seríamos mais felizes se a ternura de uma criança fosse eterna dentro de um adulto. Na fase adulta tudo se complica, acumulados ressentimentos e corremos o risco de tornarmos doentes emocionais. Os medos já não são mais de monstros, mas de encarar os problemas que surgem constantemente; às vezes é tão chato ter crescido.
Hoje, de forma avassaladora, as lembranças da infância chegou durante uma madrugada calorenta. Chegou de forma tão doce. Consigo sentir o cheiro das tangerinas, a manga verde com sal e da "goiaba branca" da casa da minha avó. Fecho os olhos, e vejo o balanço no pé de goiaba que ficava próximo ao pé de limão boi. Meu quintal era tão lindo, tinha várias margaridas e árvores frutíferas, passava a tarde toda brincando no melhor lugar do mundo, o lugar que me fazia tão feliz. Era no meu quintal que eu inventava minhas histórias, cantava sem vergonha, morria de medo das cobras que saiam do “mangueiro” e cismavam em invadir meu quintal. Lembro das hortas lindas que minha mãe cuidava com tanto amor, mas a chegada dos cachorros fez com que elas desaparecessem.

Coisa estranha é saudade que chega sem pedir licença e se hospeda dentro de nós. Consigo sentir o gosto de alguns docinhos, os melhores que já comi. Lembro-me das tartaruguitas que minha mãe comprava depois que eu saia da catequese. Fecho os olhos e vejo uma pequenina barraca no centro da cidade, várias árvores faziam sombra e eu feliz com meus docinhos. A felicidade custava tão pouco quando eu era criança. Ela vinha em forma de tartaruga de chocolate ou maria mole. Na minha infância, os doces pareciam ser mais gostosos do que os de hoje em dia, ou talvez, o paladar que era menos exigente. O centro da cidade era lindo, cheio de árvores que fazia uma sombra gostosa.

Nos dias decorrentes da semana, um senhor de estatura média, passava na rua em que eu moro vendendo badegas de cocos em forma de colares. Alguns colares vinham pendurados no pescoço dele e mesmo assim, as crianças saboreavam aquelas badeguinhas de coco. Se fosse hoje, aquele senhor seria autuado por falta de higiene. Mas na minha infância, ele era o cara que sempre alegrava minhas tardes. Que saudade daqueles colares !
Olha o quebra queixo! Olha o quebra queixo! E lá vem vindo aquele senhor baixo, com um pano na cabeça, um triângulo para entoar seu barulho e o doce dentro de uma caixa de madeira e um suporte. O senhor não era um ser muito alegre, mas alegrava e muito a tarde de tanta gente.

Sempre procurei alegrar-me com as coisas mais simples da vida. Um cartão substitui um presente, as músicas ainda me emocionam, pedalar e deixar o corpo fluir, sentir saudades de um doce ou da chuva. Memória é lugar de sentimentos que faz uma pessoa viajar em suas ou nas lembranças de alguém. Memória é trazer a saudade em forma de palavras repletas de sentimento.

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