domingo, 16 de abril de 2017

Domingo, dia de ir ao estádio





Herdei o gosto pelo futebol do meu pai. Durante muitos anos fui encarregada de anotar os jogos do final de semana para que ele pudesse fazer seus bolões.
Meu pai também foi o responsável por me apresentar o Heraldão, estádio do time do Poções. Creio que fui em apenas quatro ou cinco jogos e foi no período glorioso do time. Recordo da minha felicidade em saber que eu ia ao “Campo de futebol”. A fila, a passagem pela bilheteria, os passos contados até chegar à arquibancada e a procura por um lugar privilegiado.
O entusiasmo e barulho de Tonhão do sambão e CIA animando a arquibancada, algumas bandeiras sendo sacudidas, alguns torcedores próximos ao alambrado e ambulantes circulando com seus isopores. O pipoqueiro ficava parado, próximo a entrada do estádio. Eu passava o jogo inteiro comendo amendoim ou pipoca. Os amendoins vinham dentro de sacos transparentes e as pipocas eram doces e coloridas. Ah! Tinha algodão doce também. Dispensava milho cozido.
Meu pai sentava ao lado de seus amigos. A cada lance, era tecido um comentário, e na hora do gol, meu Deus, uma explosão de felicidade. Pai me explicava o significado de alguns lances e mesmo quando não entendia, fingia estar por dentro de tudo que ele falava para alegrá-lo. Gandula, carrinho, juiz ladrão, olha a falta, palavrões, ele merece expulsão, que cara perna de pau... Eram as palavras que eu mais escutava no decorrer do jogo.
Na minha ultima ida ao estádio houve briga,e depois daquele dia, nunca mais voltei. Mas acompanhava a transmissão pelo rádio, sozinha ou com meu pai. Acredito que poucas meninas tiveram o privilégio de acompanhar seus pais a uma partida de futebol a vinte anos atrás. Amava comentar com meus colegas de como era maravilhoso assistir o “Poções” jogar, e alguns me olhavam com aquela expressão que diz “ela está mentindo”.
O orgulho da nossa cidade, o “Poções”, transformou-se em boas recordações. O time saiu de cena durante anos e faz pouco tempo que vem tentando retornar ao cenário estadual. Time querido, renasça e galgue voos esplêndidos! Tua torcida te espera, as tardes de domingo sentem sua falta e os adversários anseiam pelo seu retorno.

Suerlange Ferraz


segunda-feira, 3 de abril de 2017

A panificadora de seu João





O centro da cidade de Poções ficou entristecido quando a panificadora de seu João Cambuí fechou as portas. Foi uma notícia que demorou a ser digerida pelos seus clientes. Não era apenas um espaço para comprarmos pães e outras gostosuras. Era o lugar dos encontros, momento de escutar alguém comentar sobre futebol e política, conhecer novos frequentadores do ambiente. Era um espaço que se tornou familiar.

Quando eu ia à universidade pela manhã, ficava aguardando o ônibus e olhava a fumaça que saia da chaminé e à tardezinha, eu ou minha mãe, íamos comprar pãezinhos quentes, chimangos e bolo de aipim. Por incontáveis vezes, ficava esperando a chuva passar, porque quem é poçoense sabe, que quando chove uns dez minutos o centro da cidade alaga, e o refúgio, de tantos como eu, era o estabelecimento de Seu João, que sempre paciente e com um sorriso conversava com seus clientes.

Segundo informações cedidas por uma das filhas de seu João, Meire, a panificadora funcionou por mais ou menos sessenta anos. O pioneiro foi seu Arlindo Viera da Silva. Anos depois, seu João assumiu a administração e na última década, um de seus filhos passou a tomar conta do negócio. Quantas gerações se alegraram naquele espaço, que aparentemente era tão pequeno, mas o aconchego do ambiente fazia com que quem passasse por ali se sentisse acolhido.

Em 2017, completa quatro anos que as portas do estabelecimento não se abriram mais. Soube da notícia através de meu pai. Lembro que durante alguns dias, uma placa foi fixada na porta, com um aviso que informava o encerramento definitivo das atividades naquele local. Era inacreditável!

A praça perdeu um dos seus pontos mais charmosos. Não é um charme relacionado ao luxo, mas aos valores afetivos e gastronômicos. Faz muito tempo que não sinto o gosto de um pão tão saboroso, com a manteiga derretendo sobre o miolo macio, ou das maravilhosas bolachas, conhecida pela população como “televisão”, e do biscoito “avoador”.

Seu João, obrigada por ter proporcionado tantos momentos bons aos seus clientes e aos excluídos da sociedade. Sei que o senhor era responsável por distribuir pães a algumas entidades sociais da cidade. A caridade se fazendo presente em um espaço tão acolhedor, tão familiar.

A memória também tem gosto e cheiro. A recordação me trouxe as andanças pela calçada em direção à panificadora, e o cheirinho bom daquele que seria meu lanche ou café da manhã, o pão.

Su Ferraz